JACARÉ E A LAGARTIXA 17 (Dezembro 2004)
AS LISTAS NACIONAIS
DEZ COISAS MAIS
Coragem das nossas tropas da GNR no Iraque, a que não tem faltado voluntários nem dedicação. É pelo dinheiro? É pelo bravado? Também é, mas é também pelo patriotismo de quem se sente militar.
A campanha eleitoral do PS entre Alegre e Sócrates foi um exemplo do envolvimento da opinião pública numa contenda interior num partido. O PSD, noutros tempos, e com outra fórmula, já foi capaz disto. Agora não é e foi o PS a fazê-lo e bem.
A Lei das Rendas esteve para ser mais radical, mas foi progressivamente “moderada” pelas pressões dos inquilinos. Mesmo assim ela podia, a prazo, inverter o papel do arrendamento urbano e diminuir a degradação das grandes cidades portuguesas. Não passou devido à dissolução, mas fica como um marco.
O fim das SCUTs, que devia ser universal e passou a ser casuístico, também devido às pressões das autarquias e populações, era uma correcção mais que necessária de um dos desmandos orçamentais mais flagrantes da governação Guterres. Também caiu com a dissolução, mas, mais cedo ou mais tarde, terá que se voltar a esta medida sob pena de não haver orçamento para as obras públicas.
O Euro2004 não era, de longe, prioridade nenhuma, muito menos “desígnio nacional”. Mas, já que se fez, ao menos que se tenha feito bem, como tudo indica que aconteceu.
A investigação da corrupção no futebol parece ter começado a sério. O “apito dourado”, um nome um pouco imbecil, traduz pelo menos uma vontade de esclarecimento que se espera vá até ao fim.
Pouco a pouco, o jornalismo português vai fazendo uma auto-reflexão crítica, com destaque para as iniciativas do Clube dos Jornalistas e para os blogues (como o Ponto Média e o Jornalismo e Comunicação), e para as revistas académicas e estudos, em particular da colecção dirigida por Mário Mesquita. Ainda há muita reacção corporativa pavloviana, mas o contrário também se verifica. Finalmente.
Os blogues portugueses foram a mais importante alteração positiva do sistema comunicacional nacional. Têm, todos sabemos, coisas péssimas: leviandade, cobardia anónima, agressividade balofa, arrogância moral, manipulação, militantismo sectário. Mas são miasmas que vêm da nossa atmosfera pequena e asfixiante, cheia de ressentimentos e escassez de bens e lugares, para a blogosfera. Mas, da blogosfera para fora, saiu qualidade, debate, controvérsia, imaginação e notícias.
No meio de muito lixo, continuam a publicar-se bons livros. Traduções fundamentais de Frederico Lourenço (de Homero), de Vasco Graça Moura (de Petrarca), de Pedro Támen (de Proust). A publicação da correspondência António José Saraiva – Óscar Lopes e o ensaio de Fernando Gil sobre o terrorismo, o anti-americanismo e o Iraque, são bons exemplos de “não ficção”.
A consagração tardia de Paula Rego em grandes exposições nacionais que revelam uma das maiores pinturas contemporâneas, dotando-nos de um universo pictórico genuinamente novo, que só uma mulher, uma portuguesa, uma louca genial podia ter feito.
DEZ COISAS MENOS
A morte de Sousa Franco, “morto” pela maneira como se fazem campanhas eleitorais em Portugal e pelo grau zero da politiquice partidária local, neste caso, do PS de Matosinhos.
Saída de Durão Barroso, numa fuga em frente, depois de dizer que “tinha compreendido” a mensagem dos portugueses nas eleições europeias, e deixando tudo a meio para um sucessor que ele não podia deixar de saber que era incompetente como chefe de governo.
Chegada de Santana Lopes a Primeiro-ministro empurrado pela acefalia do PSD face ao poder. Se as estruturas do partido se tivessem lembrado da frase de Sá Carneiro sobre como o país deve estar à frente do partido, nunca tinham embarcado numa situação que desprestigia o partido e lhe hipoteca o futuro.
Modo como o PSD tratou Manuela Ferreira Leite mostrando como pode ser cruel a injustiça dos partidos (a sociedade portou-se bastante melhor) face a alguém que tinha ganho a batalha da interiorização da austeridade, algo que nem o tandem Soares-Ernâni Lopes tinha conseguido. Este foi o bem mais precioso da governação Barroso e logo desbaratado.
As interferências na comunicação social , a começar pelo caso Marcelo, do governo Santana Lopes. Claras, brutais, inequívocas e … completamente contraproducentes.
O anúncio do “fim” da austeridade foi o acto mais irresponsável do governo de Santana Lopes.
A pergunta do referendo europeu é um retrato de como os partidos (PS, PSD.PP) não tem respeito pelos portugueses e não hesitam em tentar manipula-los de uma forma grosseira, contribuindo para o défice democrático europeu.
A “justiça” no caso Casa Pia mostrou como era frágil, inepta e arrogante ao mesmo tempo, pouco sensível aos direitos e soçobrando no meio do mais pequeno vento dos poderosos e da manipulação dos media. Não se sabe ainda o que o processo vai dar, mas já deu o bastante para que haja muita probabilidade das vítimas continuarem vítimas.
Excesso de futebol na RTP, e populismo televisivo na TVI, são os símbolos da degradação de muita da oferta televisiva portuguesa, que se deteriora dia a dia.
Sócrates como a candidato da oposição é um péssimo sintoma do futuro. Sócrates é um produto mais “moderno” da mesma fábrica que gerou Santana Lopes. Enquanto que Lopes se fez entre o comentário desportivo e o teatro espectacular dos Congressos do PSD, Sócrates já é um produto mais dependente da imagem de holograma gerada pelos media. Sócrates tem mostrado um cinzentismo apático na oposição e pouca vontade de mudar, o que está longe de ser o bastante para quem tem posta no prato, uma mudança de ciclo político. É certo que, como governante, deu melhores provas do que Santana, mas foi demasiado pouco para fazer um currículo. Apesar de tudo, Santana Lopes tem mais vida, mais sangue, lágrimas e drama, e o choque entre os dois, à primeira vista, beneficia suficientemente Lopes para este lhe arrancar a maioria pedida.
AS LISTAS NACIONAIS
DEZ COISAS MAIS
Coragem das nossas tropas da GNR no Iraque, a que não tem faltado voluntários nem dedicação. É pelo dinheiro? É pelo bravado? Também é, mas é também pelo patriotismo de quem se sente militar.
A campanha eleitoral do PS entre Alegre e Sócrates foi um exemplo do envolvimento da opinião pública numa contenda interior num partido. O PSD, noutros tempos, e com outra fórmula, já foi capaz disto. Agora não é e foi o PS a fazê-lo e bem.
A Lei das Rendas esteve para ser mais radical, mas foi progressivamente “moderada” pelas pressões dos inquilinos. Mesmo assim ela podia, a prazo, inverter o papel do arrendamento urbano e diminuir a degradação das grandes cidades portuguesas. Não passou devido à dissolução, mas fica como um marco.
O fim das SCUTs, que devia ser universal e passou a ser casuístico, também devido às pressões das autarquias e populações, era uma correcção mais que necessária de um dos desmandos orçamentais mais flagrantes da governação Guterres. Também caiu com a dissolução, mas, mais cedo ou mais tarde, terá que se voltar a esta medida sob pena de não haver orçamento para as obras públicas.
O Euro2004 não era, de longe, prioridade nenhuma, muito menos “desígnio nacional”. Mas, já que se fez, ao menos que se tenha feito bem, como tudo indica que aconteceu.
A investigação da corrupção no futebol parece ter começado a sério. O “apito dourado”, um nome um pouco imbecil, traduz pelo menos uma vontade de esclarecimento que se espera vá até ao fim.
Pouco a pouco, o jornalismo português vai fazendo uma auto-reflexão crítica, com destaque para as iniciativas do Clube dos Jornalistas e para os blogues (como o Ponto Média e o Jornalismo e Comunicação), e para as revistas académicas e estudos, em particular da colecção dirigida por Mário Mesquita. Ainda há muita reacção corporativa pavloviana, mas o contrário também se verifica. Finalmente.
Os blogues portugueses foram a mais importante alteração positiva do sistema comunicacional nacional. Têm, todos sabemos, coisas péssimas: leviandade, cobardia anónima, agressividade balofa, arrogância moral, manipulação, militantismo sectário. Mas são miasmas que vêm da nossa atmosfera pequena e asfixiante, cheia de ressentimentos e escassez de bens e lugares, para a blogosfera. Mas, da blogosfera para fora, saiu qualidade, debate, controvérsia, imaginação e notícias.
No meio de muito lixo, continuam a publicar-se bons livros. Traduções fundamentais de Frederico Lourenço (de Homero), de Vasco Graça Moura (de Petrarca), de Pedro Támen (de Proust). A publicação da correspondência António José Saraiva – Óscar Lopes e o ensaio de Fernando Gil sobre o terrorismo, o anti-americanismo e o Iraque, são bons exemplos de “não ficção”.
A consagração tardia de Paula Rego em grandes exposições nacionais que revelam uma das maiores pinturas contemporâneas, dotando-nos de um universo pictórico genuinamente novo, que só uma mulher, uma portuguesa, uma louca genial podia ter feito.
DEZ COISAS MENOS
A morte de Sousa Franco, “morto” pela maneira como se fazem campanhas eleitorais em Portugal e pelo grau zero da politiquice partidária local, neste caso, do PS de Matosinhos.
Saída de Durão Barroso, numa fuga em frente, depois de dizer que “tinha compreendido” a mensagem dos portugueses nas eleições europeias, e deixando tudo a meio para um sucessor que ele não podia deixar de saber que era incompetente como chefe de governo.
Chegada de Santana Lopes a Primeiro-ministro empurrado pela acefalia do PSD face ao poder. Se as estruturas do partido se tivessem lembrado da frase de Sá Carneiro sobre como o país deve estar à frente do partido, nunca tinham embarcado numa situação que desprestigia o partido e lhe hipoteca o futuro.
Modo como o PSD tratou Manuela Ferreira Leite mostrando como pode ser cruel a injustiça dos partidos (a sociedade portou-se bastante melhor) face a alguém que tinha ganho a batalha da interiorização da austeridade, algo que nem o tandem Soares-Ernâni Lopes tinha conseguido. Este foi o bem mais precioso da governação Barroso e logo desbaratado.
As interferências na comunicação social , a começar pelo caso Marcelo, do governo Santana Lopes. Claras, brutais, inequívocas e … completamente contraproducentes.
O anúncio do “fim” da austeridade foi o acto mais irresponsável do governo de Santana Lopes.
A pergunta do referendo europeu é um retrato de como os partidos (PS, PSD.PP) não tem respeito pelos portugueses e não hesitam em tentar manipula-los de uma forma grosseira, contribuindo para o défice democrático europeu.
A “justiça” no caso Casa Pia mostrou como era frágil, inepta e arrogante ao mesmo tempo, pouco sensível aos direitos e soçobrando no meio do mais pequeno vento dos poderosos e da manipulação dos media. Não se sabe ainda o que o processo vai dar, mas já deu o bastante para que haja muita probabilidade das vítimas continuarem vítimas.
Excesso de futebol na RTP, e populismo televisivo na TVI, são os símbolos da degradação de muita da oferta televisiva portuguesa, que se deteriora dia a dia.
Sócrates como a candidato da oposição é um péssimo sintoma do futuro. Sócrates é um produto mais “moderno” da mesma fábrica que gerou Santana Lopes. Enquanto que Lopes se fez entre o comentário desportivo e o teatro espectacular dos Congressos do PSD, Sócrates já é um produto mais dependente da imagem de holograma gerada pelos media. Sócrates tem mostrado um cinzentismo apático na oposição e pouca vontade de mudar, o que está longe de ser o bastante para quem tem posta no prato, uma mudança de ciclo político. É certo que, como governante, deu melhores provas do que Santana, mas foi demasiado pouco para fazer um currículo. Apesar de tudo, Santana Lopes tem mais vida, mais sangue, lágrimas e drama, e o choque entre os dois, à primeira vista, beneficia suficientemente Lopes para este lhe arrancar a maioria pedida.